20080802

oito



um8


poder escrever qualquer coisa
rir-me até os meus olhos desaparecerem na água

adormecer quando estivesse cansado
— mas não me fecho
quando estou quase morto
acordo





dois8


acabar eu
lembrava-me um muro à volta
esquecer-me





três8


não ter
corria agito os braços
sentado





quatro8


amar-te-ia
depois de estás deitada
olhava





cinco8


depois
era monótono sempre à volta
o dia claro
gatinhava até não-sei-o-quê
, arranco da boca
um e outro





seis8


era também
a doçura dos teus olhos,
e havia também
(e)s(t)ão
podres na minha língua





sete8


tinha
as mãos frutos secos
apodreciam
sou





oito8


franzi ligeiramente a testa
doem-me os olhos
um dedo coça o pé
os cães
ladram enquanto eu corria lembro-me
estou
sem mais





nove8


posso dormir
(uma árvore no meio da praça uma árvore aberta em
chumbo)





dez8


sou

energia pleno vivo
zero





onze8


corrias até
vinham não se sabe como
põe-se ao lado
de onde tu
ela
és





doze8


aqui deitado
és
queria os teus ossos ao lado da poeira





treze8


rasgar a pele
abro a carne
no
além
da
carne
vi os ossos
com os gestos
todos
febril





narração8


houve a água
houve a areia
houve o cimento
houve o tijolo
estou aqui





quinze8


estás aqui
lembrei-me o teu peito
grande
e os braços à volta
nuvens
firmes
em mim



Carlos César Pacheco, 27 de Setembro de 1995, 0h30-1h40

5 comentários:

Renato disse...

Afoguei-me nos teus versos.

Ana Aitak disse...

a data ao final, é a data em que o poema foi escrito e não postado né?

Carlos César Pacheco disse...

Sim, as datas indicadas são aquelas em que o poema foi escrito. No topo está indicada a data em que foi postado: 2008 07 26 (por exemplo).

Ana Aitak disse...

Gostei muito da sua versão para o que eu escrevi, eu até gostaria de ter escrito assim, mais bonito. Obrigada, vou colocar junto do texto inicial, mais visível, pode né?

Carlos César Pacheco disse...

Claro que sim... Essas palavras são suas. Limitei-me a abrir algum espaço entre elas.

Palavras nos meus poemas:

A minha foto
[autobiografia]


gosto principalmente de não fazer nada, assim deitado de costas, aguardo que as nuvens formem letras por cima da minha cabeça (cavalos, não! - se formarem cavalos, fico logo irritado, mesmo que chova em seguida); aprecio principalmente os textos ritmados , e se se trata de poesia, o soneto; quanto ao conteúdo, que esconda sob a singeleza aprofundada reflexão; e a música, a composição dos elementos para instrumentos naturais, que seja harmoniosa e com conteúdo formal; em suma, aprecio boa música e boa literatura (nada de modernices); também gosto de melancia.

Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham o link http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.
.
[biografia]

Não (se ?) sabe se nasceu. Segundo o pai: “nunca há-de ir a lado nenhum”. Não frequentou a escola de Belas-Artes. Frequentou, sem êxito perceptível, a faculdade de ciências. Segundo alguns familiares: “é egoísta e só pensa em si próprio”. ...linguagem... ...conceptual... ...som... (...de que é a forma do espaço agarrado por uma mão aberta...) Em Agosto de 1992, vestiu-se, comprou um jornal, leu diversos anúncios. Segundo o pai: “ainda não sabe o que anda aqui a fazer”. Não conheceu Feldman, Scelsi ou Nono. É quase cego, gastando por isso muito tempo a olhar. Diz frequentemente: «século xx», «trinta e cinco mil anos», «dezasseis mil milhões de anos». Não faz nada.

Não assistiu à conferência “A arte como modo de conhe­cimento” de Jacob Bronowsky nas A. W. Mellon Lectures in Fine Arts em 1969, na National Gallery of Art de Washington D. C.; Segundo o pai, "vai morrer a fome pois não gosta de trabalhar”. Não se sabe onde estava, em Maio de 1833; Apesar de gostar de estar sentado, gosta muito de andar de comboio; “Consciência” — conceito fundamental; Escreve e fala fluentemente português; Em 1997 viu uma árvore; Desenvolveu um sistema que lhe permite estar vivo sem que o pareça; Gosta de estar parado; Não gosta de dormir; Gosta de fazer.
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ao mar

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