20080927

tudo é natureza, não há para onde fugir


14.

grava com ardor a tua mente
geme selvagem deserta
rastos de agua, um corpo de pano



8.

contemplo deitado
a luz distante sobre as ondas
o ocaso veloz

percorro sem tino
os meus objectos deixados
pela cabeça, nas estantes

não me lembro de nada
quero estar assim
a brisa sopra na montanha



10.

arderam os braços, pele na pele
na cadeira de um quarto
ressoaram as vozes, restou o tronco



6.

da tua boca
um figo
um gesto de mármore



7.

longe da natureza
ao contrário do ardor dos corpos jovens
a rir, à distância

construo uma escada por dentro de
tudo é natureza
/ não há para onde fugir



Carlos César Pacheco, 2005, Agosto 17 e 19 e Outubro 4

20080920

agarro o silêncio com um sorriso


2.

não sei do tempo que partilhamos juntos
o que mais me encantou na magia das horas como dias
instantes congelados no tempo

/ sortilégios?



3.

és-me bela sem o desejares
/ não queres, estás inocente
estou longe contigo presente de ontem
/ no duplo sentido

nas tuas mãos expressivas vejo os teus lábios



5.

soube de ti o que me aproxima
do vento disforme longínquo /a voz

não trocava o teu abraço
dos teus braços finos /a força
pelo sol das manhãs /que era de ti



17.

de rosto erguido, escolho o vento
/ rebolo-me na relva de olhos abertos
/ agarro o silêncio com um sorriso


Carlos César Pacheco, 2006, Outubro 29 e Novembro 4 e 11

20080913

mergulhando nu nas árvores por entre os ramos


1. pela paisagem ao rubro

caindo pela paisagem com os braços abertos
rebolando-me na erva, correndo
gritando com os pulmões em pleno ar
caindo e ferindo-me
espalhando pela planície estonteada
o olhar vítreo e dançante
conjugado com todos os elementos
mergulhando nu nas árvores por entre os ramos
debatendo-me contra a corrente e afundando-me
não foi em ti que me lês, que eu pensei
/ por muito solitário que te encontres



2. dentro das orelhas

caindo pelo teu peito dentro
com a cabeça decepada de olhos abertos
e com ternura contraindo-se
espasmodicamente os lábios perfurados
expondo à semelhança de cascas de ovo
/ ou como se houvesse café



3. evocação

erguendo o rosto precipitado pelo pranto
envolto nos seus cabelos ao contrário pela escada
/ em direcção ao mar


Carlos César Pacheco, 1988

20080906

vivo um momento mágico


XI

despedi-me de ti
toquei na tua face com a minha face
a minha pele a tua pele

estive contigo
sentado ao teu lado
sentado a tua frente
ouvi-te rir
vi-te sorrir
ouvi a tua voz
olhei para as tuas mãos
vi-te olhar o mar
caminhei ao teu lado

soube que o universo tem 13,7 mil milhões de anos
— de repente tudo isso perdeu importância

gosto de te amar



XVII

passar o tempo sem ti é uma forma de pensar em ti
cubro a golpes a minha imaginação
pequenina e doce é de ti que quero o tempo
dos braços, abraços que virão de onde está o futuro

é calor que encontro na tua voz
a hesitação que transparece
as palavras cortadas por outras palavras

tudo em ti me encanta

és suave e forte ...tão forte... ...onda serena...



XIX

gostava de saber escrever
um poema que reproduzisse fielmente
a beleza de seres tu

agora é o tempo de estar comigo
quero escrever um poema de palavras grandes

vivo um momento mágico


Carlos César Pacheco, Agosto de 2006

Palavras nos meus poemas:

A minha foto
[autobiografia]


gosto principalmente de não fazer nada, assim deitado de costas, aguardo que as nuvens formem letras por cima da minha cabeça (cavalos, não! - se formarem cavalos, fico logo irritado, mesmo que chova em seguida); aprecio principalmente os textos ritmados , e se se trata de poesia, o soneto; quanto ao conteúdo, que esconda sob a singeleza aprofundada reflexão; e a música, a composição dos elementos para instrumentos naturais, que seja harmoniosa e com conteúdo formal; em suma, aprecio boa música e boa literatura (nada de modernices); também gosto de melancia.

Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham o link http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.
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[biografia]

Não (se ?) sabe se nasceu. Segundo o pai: “nunca há-de ir a lado nenhum”. Não frequentou a escola de Belas-Artes. Frequentou, sem êxito perceptível, a faculdade de ciências. Segundo alguns familiares: “é egoísta e só pensa em si próprio”. ...linguagem... ...conceptual... ...som... (...de que é a forma do espaço agarrado por uma mão aberta...) Em Agosto de 1992, vestiu-se, comprou um jornal, leu diversos anúncios. Segundo o pai: “ainda não sabe o que anda aqui a fazer”. Não conheceu Feldman, Scelsi ou Nono. É quase cego, gastando por isso muito tempo a olhar. Diz frequentemente: «século xx», «trinta e cinco mil anos», «dezasseis mil milhões de anos». Não faz nada.

Não assistiu à conferência “A arte como modo de conhe­cimento” de Jacob Bronowsky nas A. W. Mellon Lectures in Fine Arts em 1969, na National Gallery of Art de Washington D. C.; Segundo o pai, "vai morrer a fome pois não gosta de trabalhar”. Não se sabe onde estava, em Maio de 1833; Apesar de gostar de estar sentado, gosta muito de andar de comboio; “Consciência” — conceito fundamental; Escreve e fala fluentemente português; Em 1997 viu uma árvore; Desenvolveu um sistema que lhe permite estar vivo sem que o pareça; Gosta de estar parado; Não gosta de dormir; Gosta de fazer.
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ao mar

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ou o silêncio