20081018

o verdadeiro espaço é o tempo vazio


3.

a história acaba aqui

sou o banco onde se senta o jardineiro

toledo aberto ao longe, no horizonte
/ rosas do meu jardim



15.

amo os homens
jardins incompletos que se fecham em leque
/ a minha máscara é um museu



4. amarelo

desejo a faca de um rio
os camponeses escondem-se por debaixo dos chapéus
o granito era o meu rosto



2.

trinta e dois lábios
gritam dos lados da américa

mãos que se estendem em vão
no azul tisnado de sangue



13.

são de pedra os rumores que sinto
ondas de cães
a estoirar
matilhas de bocas
fora e dentro do circulo
metamorfose
/ o verdadeiro espaço é o tempo vazio



Carlos César Pacheco, 2005 - Agosto 17 e 19, Outubro 4

20081011

poema-sol (sete poemas)


1.

era agosto em janeiro
o sol estalava nos meus ombros

a poesia líquida

saía do chão curvo marginal
aos pedaços de silêncio turvo
eram o mesmo grito longe



2.

sinto-me frio e corro no verão
de braços abertos, despido dos olhos
tenho as mãos secas, límpidas



3.

o mar cabelo roda à volta de mim
ténue sombra força de ti sei
que o aço dobre
.........../ pelo som dos teus dedos



4.

/ onde estarás?

tinha que saber se os olhos mel estavam contigo
eram os dias uniformes antes
de te conhecer gostava de pensar
que não sonhava por pressentir o medo de saber
/ porque me acordaste?

estava dentro da minha suave concha
sei que apenas me restam dias frios
alegre por saber que existes longe
quero pensar que posso pensar
que gostas do teu silêncio
que não interrompo
/ mas gostava de abraçar



5.

sem o tempo de saber a força
da tua luz soube no primeiro
instante que eras tu



6.

cada linha uma forma de te dizer
o que não tenho coragem de escrever
/ és a peça que incompleta o puzzle
o espaço na linha do tempo

poder fechar os braços gostava
à tua volta esse meu sono tranquilo



7.

quero saber que um dia ousaste
olhar para mim sorrindo
/ perto do mar

[o melhor sabor é o que sai
dentro da minha cabeça
/ a tua voz
através do espaço contabilizado
pelas grandes multinacionais]


Carlos César Pacheco, 2001 - Agosto 9 e 11

20081004

fá . in memoriam

elegia para uma amiga morta por vontade própria



sete anos depois


braços caídos estendidos braços abertos
abraços em silêncio de braços contidos
entre-braços descobertos. aos esgares abraços
trementes braços alegres abraços de braços
tristes. próximos. últimos entre-lágrimas
braços. sombrios. pendentes abraços plenos
de braços sem vida abraços estreitos por braços
interrompidos graníticos. fechados
eternos entre-cordas



oito anos depois

junto às favelas. na margem do rio
com um livro na mão. estava aberto
doía-te a cabeça. não lias

tinhas os olhos e eram impossíveis
antes já te tinha reconhecido
pelo menos sem o saber
tu também ou parecera-me

de qualquer modo levantaste-te
assim que me aproximei

começámos a caminhar ao longo da margem
/ vinhas de longe
disseste-me entre silêncios

o tempo distendia-se
tudo ou quase tudo pela primeira vez
e nunca mais paramos



nove anos depois

afinal teria sido fácil salvar-te
bastava ter corrido através do muro
esticando o passo através do tijolo e da argamassa

/ querias morrer
e eu não soube diluir-me



Elegia para a minha amiga Fá, que um dia morreu por vontade própria.
Carlos César Pacheco, 1992, 93, 94 - Outubro 17

Palavras nos meus poemas:

A minha foto
[autobiografia]


gosto principalmente de não fazer nada, assim deitado de costas, aguardo que as nuvens formem letras por cima da minha cabeça (cavalos, não! - se formarem cavalos, fico logo irritado, mesmo que chova em seguida); aprecio principalmente os textos ritmados , e se se trata de poesia, o soneto; quanto ao conteúdo, que esconda sob a singeleza aprofundada reflexão; e a música, a composição dos elementos para instrumentos naturais, que seja harmoniosa e com conteúdo formal; em suma, aprecio boa música e boa literatura (nada de modernices); também gosto de melancia.

Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham o link http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.
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[biografia]

Não (se ?) sabe se nasceu. Segundo o pai: “nunca há-de ir a lado nenhum”. Não frequentou a escola de Belas-Artes. Frequentou, sem êxito perceptível, a faculdade de ciências. Segundo alguns familiares: “é egoísta e só pensa em si próprio”. ...linguagem... ...conceptual... ...som... (...de que é a forma do espaço agarrado por uma mão aberta...) Em Agosto de 1992, vestiu-se, comprou um jornal, leu diversos anúncios. Segundo o pai: “ainda não sabe o que anda aqui a fazer”. Não conheceu Feldman, Scelsi ou Nono. É quase cego, gastando por isso muito tempo a olhar. Diz frequentemente: «século xx», «trinta e cinco mil anos», «dezasseis mil milhões de anos». Não faz nada.

Não assistiu à conferência “A arte como modo de conhe­cimento” de Jacob Bronowsky nas A. W. Mellon Lectures in Fine Arts em 1969, na National Gallery of Art de Washington D. C.; Segundo o pai, "vai morrer a fome pois não gosta de trabalhar”. Não se sabe onde estava, em Maio de 1833; Apesar de gostar de estar sentado, gosta muito de andar de comboio; “Consciência” — conceito fundamental; Escreve e fala fluentemente português; Em 1997 viu uma árvore; Desenvolveu um sistema que lhe permite estar vivo sem que o pareça; Gosta de estar parado; Não gosta de dormir; Gosta de fazer.
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ao mar

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ou o silêncio