20081004

fá . in memoriam

elegia para uma amiga morta por vontade própria



sete anos depois


braços caídos estendidos braços abertos
abraços em silêncio de braços contidos
entre-braços descobertos. aos esgares abraços
trementes braços alegres abraços de braços
tristes. próximos. últimos entre-lágrimas
braços. sombrios. pendentes abraços plenos
de braços sem vida abraços estreitos por braços
interrompidos graníticos. fechados
eternos entre-cordas



oito anos depois

junto às favelas. na margem do rio
com um livro na mão. estava aberto
doía-te a cabeça. não lias

tinhas os olhos e eram impossíveis
antes já te tinha reconhecido
pelo menos sem o saber
tu também ou parecera-me

de qualquer modo levantaste-te
assim que me aproximei

começámos a caminhar ao longo da margem
/ vinhas de longe
disseste-me entre silêncios

o tempo distendia-se
tudo ou quase tudo pela primeira vez
e nunca mais paramos



nove anos depois

afinal teria sido fácil salvar-te
bastava ter corrido através do muro
esticando o passo através do tijolo e da argamassa

/ querias morrer
e eu não soube diluir-me



Elegia para a minha amiga Fá, que um dia morreu por vontade própria.
Carlos César Pacheco, 1992, 93, 94 - Outubro 17

1 comentário:

Iolanda Aldrei disse...

Tanta voz, tanta luz, tanta palavra...
Sentir!

Palavras nos meus poemas:

A minha foto
[autobiografia]


gosto principalmente de não fazer nada, assim deitado de costas, aguardo que as nuvens formem letras por cima da minha cabeça (cavalos, não! - se formarem cavalos, fico logo irritado, mesmo que chova em seguida); aprecio principalmente os textos ritmados , e se se trata de poesia, o soneto; quanto ao conteúdo, que esconda sob a singeleza aprofundada reflexão; e a música, a composição dos elementos para instrumentos naturais, que seja harmoniosa e com conteúdo formal; em suma, aprecio boa música e boa literatura (nada de modernices); também gosto de melancia.

Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham o link http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.
.
[biografia]

Não (se ?) sabe se nasceu. Segundo o pai: “nunca há-de ir a lado nenhum”. Não frequentou a escola de Belas-Artes. Frequentou, sem êxito perceptível, a faculdade de ciências. Segundo alguns familiares: “é egoísta e só pensa em si próprio”. ...linguagem... ...conceptual... ...som... (...de que é a forma do espaço agarrado por uma mão aberta...) Em Agosto de 1992, vestiu-se, comprou um jornal, leu diversos anúncios. Segundo o pai: “ainda não sabe o que anda aqui a fazer”. Não conheceu Feldman, Scelsi ou Nono. É quase cego, gastando por isso muito tempo a olhar. Diz frequentemente: «século xx», «trinta e cinco mil anos», «dezasseis mil milhões de anos». Não faz nada.

Não assistiu à conferência “A arte como modo de conhe­cimento” de Jacob Bronowsky nas A. W. Mellon Lectures in Fine Arts em 1969, na National Gallery of Art de Washington D. C.; Segundo o pai, "vai morrer a fome pois não gosta de trabalhar”. Não se sabe onde estava, em Maio de 1833; Apesar de gostar de estar sentado, gosta muito de andar de comboio; “Consciência” — conceito fundamental; Escreve e fala fluentemente português; Em 1997 viu uma árvore; Desenvolveu um sistema que lhe permite estar vivo sem que o pareça; Gosta de estar parado; Não gosta de dormir; Gosta de fazer.
.

ao mar

Subscreva a newsletter e receba no seu mail um poema novo, em cada semana.
Email:
Visit this group

ou o silêncio