20080816

a sombra quente do orvalho


um dia acaba dentro de outro
começa cedo e finda dentro do outro
repetido até destruir a memória
a capacidade de escrever, de ser
acaba/começa amálgama indistinta
até renascer a vontade de ir para casa
indistinta e distante, forte depois
até dar por mim parado na rua
onde hei-de aprender a voltar a andar

à medida que caminho e me afasto
dos pensamentos onde estava
o espaço que ocupo desloca-se comigo
na tarde íngreme da calçada
onde estriba o eléctrico outra vez
cheio de risos e de sonhos, ao longe
aproximo-me de outros pensamentos
passo por passo - quieto.


(continua)


Carlos César Pacheco, Novembro de 2005

10 comentários:

Pétalas D'Alma disse...

Desculpe a minha ousadia, mas diante de um texto como este não pude me conter em colocar alguma palavras ...

Na memória, o mundo que aprendo vai fixando e tomando forma,
idéias se moldam e tomam sentido. Os meus sentidos,
re-experimentando sensações prazeres involuntários
que me são apresentados à medida que caminho.
Sigo captando energias exaladas ao meu redor,a aurora que despenca sobre mim, traz a sombra quente do orvalhoque inebriantemente me seduz. Seduzida vou por caminhos
nunca trilhados sem temer, o desconhecido que me atrai.
A ousadia me persegue e impulsiona, vou aprendendo
a passos largos, vivencio, absorvo e alimento meu interior.
O mundo ao meu redor toma nova forma, nova cor,
que diante dos meu olhos se materializam, a mente assimila
é um novo transfigurar uma nova descoberta.(solange Bretas)

Belo texto, reflexivo e inteligente... Agradeço por partilhar seus textos e também por receber sua visita no Recanto das Letras.

Anónimo disse...

uma continuação; quem sabe!


mas o meu olhar segue desperto,
espreitando o universo á minha volta,
escutando os seus ecos e sussurros,
que adentram vãs, pois são lamentos.
a minha noite não começa sem o dia,
que findo, não quer ver a noite chegar,
tudo apaga começando a partir de mim,
o último passo para o definitivo findar.

arrisco, sigo solene qual andarilho,
cambaleante pelas ermas arruelas,
nos becos entre os seios das vadias,
freqüentando os bares e as orgias.
piso esse santuário de alquimias,
inspiração para poetas e poetisas,
lar dos ébrios, loucos por boemia,
onde eu bebo a mais pura poesia.

um abraço,
Silveira

jorgeferrorosa disse...

Profundo, muito belo. Vou estar atento ao resto. Abraço
Caderno da Alma

ana rita disse...

Ando com o tempo comprimido, depois paro para ler suas poesias. POr enquanto vou me deter nesta.
Olha, a tarde íngreme, amálgama indistinta e isso de reaprender a andar povoaram minha tarde de ternuras.

Ana Aitak disse...

Esteja à vontade para fazer do meu texto um conto,facilmente, assim como fez um poema a parti daquele outro. Eu não saberia. Mas pode ficar bonito sim.

E o seu outro blog em parceria com Hemisfério Norte, é muito legal, eu publiquei um poema dela no meu, há algum tempo, se não me falha a memória do blog dela Palavras com cheiro, muito bom também.

Carlos César Pacheco disse...

Obrigado Ana... mas eu sugeri que o fizesse pois acho a ideia muito boa e está quase. Tal como aquele outro poema é seu (não meu). Aliás acho que o conto ficaria com a qualidade da autora que referiu. É uma grande escritora. Uma das minhas preferidas.

Mª Dolores Marques disse...

Passo a Passo

Passo a passo eu…
Sou nesta íngreme subida
E sou o vento
E a melodia
E sou o sonho
E a nostalgia

Passo a passo eu...
Sou neste culminar do dia
E sou a terra
E a malvasia
E sou um nome
E a dor que encerra

Passo a passo eu...
Sou neste ventre uma luz crescente
E sou o mar
E a maresia
E sou um mundo
E alegoria....

Dolores Marques

Maria Oliveira disse...

Realmente... uma grande capacidade de introspecção.

O texto cativa-nos do princípio ao fim!

Abraço

Emanuel Azevedo disse...

O que vou dizer? Nem eu mesmo sei. LINDO.

Xinha disse...

Dei por mim.. serena.. a ler e reler este seu poema !
É doce.. suave...
É um momento de introspecção tão bem feita... que me senti personagem do seu poema !!

Xi-coração

Palavras nos meus poemas:

A minha foto
[autobiografia]


gosto principalmente de não fazer nada, assim deitado de costas, aguardo que as nuvens formem letras por cima da minha cabeça (cavalos, não! - se formarem cavalos, fico logo irritado, mesmo que chova em seguida); aprecio principalmente os textos ritmados , e se se trata de poesia, o soneto; quanto ao conteúdo, que esconda sob a singeleza aprofundada reflexão; e a música, a composição dos elementos para instrumentos naturais, que seja harmoniosa e com conteúdo formal; em suma, aprecio boa música e boa literatura (nada de modernices); também gosto de melancia.

Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham o link http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.
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[biografia]

Não (se ?) sabe se nasceu. Segundo o pai: “nunca há-de ir a lado nenhum”. Não frequentou a escola de Belas-Artes. Frequentou, sem êxito perceptível, a faculdade de ciências. Segundo alguns familiares: “é egoísta e só pensa em si próprio”. ...linguagem... ...conceptual... ...som... (...de que é a forma do espaço agarrado por uma mão aberta...) Em Agosto de 1992, vestiu-se, comprou um jornal, leu diversos anúncios. Segundo o pai: “ainda não sabe o que anda aqui a fazer”. Não conheceu Feldman, Scelsi ou Nono. É quase cego, gastando por isso muito tempo a olhar. Diz frequentemente: «século xx», «trinta e cinco mil anos», «dezasseis mil milhões de anos». Não faz nada.

Não assistiu à conferência “A arte como modo de conhe­cimento” de Jacob Bronowsky nas A. W. Mellon Lectures in Fine Arts em 1969, na National Gallery of Art de Washington D. C.; Segundo o pai, "vai morrer a fome pois não gosta de trabalhar”. Não se sabe onde estava, em Maio de 1833; Apesar de gostar de estar sentado, gosta muito de andar de comboio; “Consciência” — conceito fundamental; Escreve e fala fluentemente português; Em 1997 viu uma árvore; Desenvolveu um sistema que lhe permite estar vivo sem que o pareça; Gosta de estar parado; Não gosta de dormir; Gosta de fazer.
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ao mar

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